Abrir o coração com delicadeza e desmembrá-lo gomo a gomo, sem desperdiçar nenhuma gota. Sorver os sentimentos, curar as feridas, estancar a dor e levá-lo novamente ao peito, pronto para o que vier. Exercício de mãe, cotidiano.
Prisioneira de mim mesma, castigo-me com padrões exigentes e a total falta de perdão. Minha generosidade dedico aos outros, e também minha compaixão. Pra mim, a prisão perpétua, aos outros, a libertação.
Copos sujos espalhados pela casa. Confusão de almofadas, emaranhado de roupas. Na boca, uma sensação já velha conhecida. É preciso mudar agora mesmo. Ou quem sabe amanhã bem cedo?
Estou sempre recolhida aos pensamentos mais íntimos. Só eu sei do tamanho das pedras que caem na água, dos ventos que me descabelam, das chuvas que turvam a água dos rios. Quando dei por mim, já estava assim.
Soltei um grito alto e estridente, para quem quisesse ouvir. Pra fora, pra cima, pros lados, pra todo mundo e pra ninguém. Depois vesti minha melhor roupa, penteei os cabelos, passei perfume. E fui me exibir aos transeuntes mais leve do que nunca.
Exercitando o desapego. Despindo os excessos, desprezando os volumes, desconstruindo as formas. Serenamente, calmamente. De tal forma que a essência se manifeste. E só.
Um dia depois do outro, deixo 2010 passar entre meus dedos. De repente, estamos em março e eu nem sei dizer o que fiz de janeiro e fevereiro. Treinada para entender a tudo e a todos, procuro explicações para os dias que passam como relâmpagos. Mas na verdade não há explicações, só sentimentos. E eu me deixo levar por mais um mês. Daqui a pouco é abril.